Santo Antão e o Bebê Rena

19/05/2024 by in category Textos tagged as , , with 0 and 0

Santo Antão queria ser santo. Para tanto, passou a vida dentro de uma caverna, jejuando e sendo atacado pelo demônio. Quando Antão rezava, o demônio vinha lhe distrair. Quando Antão olhava para o crucifixo, ao invés de Cristo, o demônio fazia ele ver uma mulher nua. Quando Antão estava fazendo jejum, o demônio preparava um banquete com as mais deliciosas comidas.

Mas Antão foi fiel. Resistiu a tudo. Então, quando Antão estava próximo de completar 105 anos, o demônio desistiu e disse: “Você me venceu, Antão! Pela primeira vez encontrei um homem mais forte que eu”. O demônio virou as costas e começou a sair da caverna. Antão caiu de joelhos e disse: “Finalmente, senhor, agora me tornei um santo”. O demônio sorriu e voltou.

Tem pessoas que contam essa história dizendo que Antão resistiu a todas as tentações menos a vaidade. Não discordo, mas acho pouco. Usar a palavra vaidade como crime, bater o martelo e encerrar o assunto, é jogar fora o bebê junto com a água suja do banho. Afinal, ser vaidoso do próprio desenvolvimento, não é crime, nem faz mal a ninguém. Para mim, o verdadeiro pecado de Santo Antão, foi a outro-estima.

Preciso explicar esse termo para que você me entenda. Auto-estima é quando seu valor próprio está baseado em sua própria atribuição, logo, independe da atribuição do outro. Outro-estima é o oposto, é quando seu valor próprio é baseado na atribuição do outro. Por exemplo. Se considerar um péssimo jogador por atribuição própria é auto-estima. Se considerar um ótimo jogador por atribuição do outro é outro-estima.

Auto-estima e outro-estima não diz respeito a qualidade da sua avaliação de valor, diz respeito a fonte da avaliação. Quando a fonte é você mesmo, seja a qualidade ótima ou péssima, é auto-estima. Quando a fonte é o outro, seja a qualidade ótima ou péssima, é outro-estima.

Quando digo que o pecado de Santo Antão foi outro-estima, estou me referindo a fonte da sua estima. Ele não resistiu as tentações para vencer o demônio e provar sua determinação a si mesmo (auto-estima), mas para mostrar para Deus que ele merecia seu apreço, que merecia ser considerado santo (outro-estima). Santo Antão passou 105 anos tentando comprar o amor de Deus.

Quando terminou o sexto episódio da minissérie Bebê Rena, depois que o protagonista confessou todos seus pecados chorando em um palco de stand up comedy, eu pensei: “Pronto, terminou! Por que será que tem um sétimo episódio?”. E a resposta era, porque o demônio da outro-estima e muito mais traiçoeiro, ardiloso e sútil do que qualquer Santo Antão possa imaginar.

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