Quando estava no último ano do ensino fundamental, o professor de história fez uma atividade que jamais vou me esquecer. Primeiro ele pediu que lêssemos uma série de livros sobre a segunda guerra mundial e o holocausto. Depois, ele dividiu a classe em dois grupos, feito um tribunal e pediu que fizéssemos o julgamento de Hitler. Um grupo eram os advogados de ataque, eles tinham a missão de condenar Hitler pelos seus erros. Outro grupo eram os advogados de defesa, que tinham a missão de defender Hitler.
Assim que o professor explicou sobre o julgamento de Hitler, começou um tumulto na sala. Ninguém, absolutamente ninguém, queria fazer parte do grupo dos defensores de Hitler. E mais! Os alunos ficaram indignados com a proposta do professor. Onde já se viu defender Hitler! Mas o professor sabia o que estava fazendo e continuou fazendo. Primeiro ele escolheu os dois melhores alunos da sala e os colocou como líderes de cada grupo. Depois foi dividindo o resto dos alunos entre um grupo e outro.
Quando chegou o dia do julgamento, tinha certeza que a condenação de Hitler era causa ganha. Mas para o meu espanto, Ulisses, que era o melhor aluno da sala e estava no grupo de defesa, apresentou argumentos que fizeram as pessoas, senão mudarem de ideia sobre Hitler, pelo menos, ir além da superficialidade. Outra coisa que me chamou a atenção no julgamento de Hitler, foi que os sólidos argumentos de Ulisses eram sempre contra-atacados como frases carregadas de ódio e que diziam sempre o mesmo: “Hitler é um monstro!”.
Muito bem, o que essa história sobre o julgamento de Hitler tem a ver com o hábito da reclamação? Simples! Você já viu alguém ser condenado por heroísmo? Claro que não! Só vilões são condenáveis. Agora, observe quando está reclamando de alguém. Sua reclamação visa colocar o outro na posição de herói ou de vilão? Visa colocar o outro na posição de vilão. Visa transformá-lo em um monstro. E por quê? Porque você precisa que o outro seja o culpado para você ser a vítima. Porque você precisa que o outro seja o monstro para você ser o herói.
Quando você demoniza o outro, reclamando do outro para todo mundo, isso se chama maledicência. A maledicência é o super escudo do super-herói. É através da maledicência que você se impede de olhar para si e assumir a culpa pelo seu arbítrio. “Olha o que o outro fez! Ele é um monstro! Olha como a culpa é dele!”. Claro que o outro é culpado pelo arbítrio dele, mas você é o culpado pelo seu, e a maledicência é um mecanismo de defesa que você coloca em prática justamente para se esquecer disso.
Sendo assim, para se libertar do hábito da reclamação, é fundamental que você observe o funcionamento da sua maledicência toda vez que estiver sendo maledicente. Observe que seu objetivo com a maledicência não é demonizar o outro, mas se colocar na posição de vítima. Por fim, observe que esse jeito de viver não lhe ajuda a fazer melhores escolhas e viver melhor, apenas lhe mantém preso ao outro e a reclamação.