Depois do despertar existencial, eu tinha um trabalho a fazer: explicar sobre meditação. Nessa época, a internet estava em plena expansão e surgiram os blogs. Criei um blog chamado Pegando Buda Para Cristo onde publicava cartas destinadas ao Buda. Não tenho nenhum texto guardado dessa época, mas naveguei na internet e encontrei esse:
Olá Buda! Um amigo me pediu que lhe ensinasse a ser criativo. Nem sempre se pode ser Deus, mas nesse dia tive a chance. Eu disse ao meu amigo: “Erre!”. Ora, Deus falou para Adão não comer a maçã, mas se quisesse realmente evitar a mordida, bastava ficar calado. Vai falar para uma criança não colocar o dedo na tomada! A recomendação divina foi a própria serpente. Tratando-se de conhecimento novo, para o bem ou para o mal, errar é a única resposta certa. Basta olhar para os gênios da humanidade. Gênio só vira gênio depois que erra. O problema é que todo o mundo quer acertar, daí vira bolo de caixinha. A receita do bolo novo só quem conhece é o erro. João, por exemplo, errou no jazz e acertou a bossa nova. Jorge errou na bossa e acertou o sambarroque (com dois erres). Arre! Meu amigo queria acertar no erro. Com o perdão da amizade: fodeu! Não dá para errar acertando. Eis o dilema das escolas. Professor só consegue ensinar o certo, não consegue ensinar a errar. Errar não é ensinável, nem aprendível. Por isso é misterioso, milagroso e divino. Quem gosta do certo é o Diabo, reacionário. Deus, criativo, aprecia mesmo um belo erro. Lúcifer e Adão que o digam.
Os textos destinados ao Buda se espalharam pela internet. O Blog começou a ter seguidores. Então, criei uma nova série chamada Matrix Zero. Eu sabia de cor e salteado todos os diálogos do filme Matrix, então, tive a ideia de traduzi-los e adaptá-los para questões existenciais. Não tenho nenhum texto da série Matrix Zero comigo e também não encontrei nenhum na internet, mas eram bem interessantes e fizeram mais sucesso do que as cartas para o Buda.
Por conta do blog Pegando Buda Para Cristo, acabei sendo adicionado naqueles grupos do yahoo que mencionei no primeiro capítulo. Em alguns fui adicionado, em outros, eu mesmo entrei. Um dos grupos que entrei se chamava ciência list (c-list).
Não contei nada da minha infância até agora, mas sempre fui fascinado por ciências. Meu fascínio era mais especificamente por eletricidade e magnetismo. Um dos meus brinquedos favoritos era um laboratório de ciências. Tinha experiências com ímãs, com motores e com substâncias químicas. Eu prestei vestibular na USP para engenharia eletrônica. Não passei, mas se tivesse passado, provavelmente teria me tornado um cientista.
Depois do despertar existencial, me deu uma curiosidade de estudar a natureza da matéria. Me lembrei que a equação de Einstein, e=mc2, explicava a relação entre massa, energia e velocidade da luz, mas não explicava cada um dos termos. Precisava conversar com alguém que pudesse me explicar. Foi por isso que entrei no grupo da ciência list.
O grupo da ciência list era formado por professores e alunos de ciência do Brasil inteiro. A maioria dos integrantes eram cientistas da área de física, então, rapidamente arranjei vários interlocutores. Minha primeira manifestação no grupo foi algo assim: “Sou leigo em física e estou querendo entender a equação de Einstein, e=mc2, alguém pode me ajudar?”.
A ajuda veio prontamente. Qual professor não gosta de encontrar um aluno faminto por conhecimento? Comecei a conversar com os professores de física da lista. Como era leigo no assunto, podia fazer as perguntas mais básicas. Como as perguntas mais básicas são sempre as mais difíceis de responder e as mais interessantes de estudar, ganhei o apreço dos professores.
Em pouco tempo estava sendo elogiado pelos professores da lista e citado como exemplo de aluno. Alguns dos professores eram excelentes e meu entendimento de física foi crescendo rapidamente. Tudo ia muito bem, entre eu, aluno, e eles, cientistas e professores, até que meus questionamentos me levaram à questão da medição.
Quando entrei no grupo, disse estar interessado em entender a equação de Einstein, mas não disse que achava estar faltando algo fundamental na equação: a consciência. Foi por isso que meus questionamentos me levaram à questão da medição.
Eu estava querendo saber qual era o alicerce da matéria, fosse energia, massa ou o que fosse. E conversando com os cientistas, entendi que o alicerce era a medição, pois era pela medição que tudo começava. Então, não me restava outra pergunta senão: o que é medir?
E foi assim que de aluno exemplar, despenquei para chato, cricri e pernilongo. Embora a pergunta “o que é medir?” seja simples e alicerce de toda a ciência, é uma pergunta impossível de ser respondida cientificamente, porque medir não é um processo científico, é um processo autocientífico, ou seja, é um processo consciencial.
Medir é observar. Quem observa que uma caneta tem 15 centímetros não é a régua, é o usuário da régua. A régua é apenas um instrumento que o usuário usa para executar um processo que acontece nele e não na régua. Esse processo é a cognição (consciência). Isso era óbvio para mim, porém, para o meu espanto, era ignorado pelos cientistas.
Teve uma vez que abri um tópico de debate com a seguinte pergunta: quanto é um?
— Ora, um é um — eles diziam.
— Sim, mas quanto é um?
— Um é um — eles repetiam.
— Sim, mas quanto é um? — eu insistia — Dois é um mais um. Três é um mais um mais um. Quatro é um mais um mais um. Minha pergunta é: quanto é um?
— Um é um — eles repetiam.
Quanto mais eu questionava a questão da medição, mais os professores, que antes me elogiavam, passavam a me dar sermão e carteirada:
— Vai estudar física, rapaz! Ciência não é filosofia! Você está viajando na maionese — eles diziam e eu apertava ainda mais a ferida.
Após me desqualificarem de cabo a rabo e me jogarem na fogueira de tubos de ensaio, me expulsaram da c-list. Para mim, ciência era uma tocha acesa no escuro buscando a verdade a qualquer preço. Então, fiquei muito decepcionado com a ciência. Mas depois entendi que aquele comportamento era dos cientistas e não da ciência.
E mais uma vez ficou evidente que o caminho para a verdade não estava na busca pela verdade, mas no encontro com a mentira. No caso da ciência, no encontro com o materialismo.
Essa música eu fiz para os caras da c-list:
https://www.youtube.com/watch?v=0aAl0hTpCbI
Ele tem RG e brevê
É doutor e PHD
Anel de bacharel e você
Ainda quer discutir com o cara
Pois bem, fique você sabendo, ninguém
Sobre tudo, contudo e porém
Tem conhecimentos além
Para poder discutir com o cara
Mas se arrancarem o pingo do “i”
Quebra as pernas e vira saci
Já não sabe o valor de pi
Não sabe onde põe a cara
Pois quem sabe já não pensa
E quem pensa já não sabe
E só quem sabe a diferença
Só quem sabe, sabe