45 | PRAGA PARA PEGAR BOBO

19/10/2022 by in category Mayasang with 0 and 0

Quando decidi alugar meu apartamento e sair de São Paulo, minha namorada (atual esposa) me sugeriu morar em Uberlândia. Para mim, essa decisão implicava em casamento, ou pelo menos, em morarmos juntos. Dizem que casar a primeira vez é ingenuidade e a segunda é burrice. Eu já havia sido ingênuo e burro. Parti para a melhor de três.

Na quarta-feira de cinzas do carnaval de 2012, cheguei em Uberlândia apenas com uma mala de roupas. Minha namorada foi me pegar na rodoviária e fomos tomar café numa padaria. Durante o café, eu lhe convidei para morarmos juntos. Primeiro ela ficou surpresa, depois pensativa, por fim, aceitou.

Nos dias seguintes, entramos em contato com as imobiliárias da cidade e começamos a procurar uma casa para morarmos. Durante esse processo, encontramos uma casa pequena e aconchegante, que seria apelidada de Mocó. Tinha dois andares. Os quartos ficavam no andar de cima e a sala em baixo. O preço era bom. Assinamos o contrato e começamos a mudança.

Logo que nos mudamos, saí para caminhar no final da tarde. Fui até uma área de ginástica na beira do Rio Uberabinha e me sentei em um banco. De repente, senti meu corpo leve como uma pluma.

Eu havia saído do EEU, criado a 1ficina, saído de São Paulo, arrendado meu apartamento, me mudado para Uberlândia, alugado uma casa e me casado pela terceira vez. Havia demolido uma realidade e construído outra tão rapidamente que nem percebi que a nova realidade estava finalizada. Só percebi naquele instante.

Deitei no banco. Meu olhar mergulhou feito telescópio no azul do céu. Senti extrema feliSIMdade por estar me permitindo viver minha verdade, apesar dos pesares. Depois, pensei na coletividade humana aprisionada no outroísmo e me senti mal por estar me sentindo tão bem. Passei uma semana exalando feliSIMdade em alta voltagem.

Que seus sonhos não se realizem.
Que o peido saia molhado.
Que o bolo não cresça
para nenhum lado.

Que macacos lhe mordam.
Que fique menstruada na praia.
Que ninguém lembre do seu aniversário.
Tomará que caia!

Que uma bala perdida encontre sua bunda.
Que pegue bicho de pé no nariz.
Que sonhe com Hebe Camargo pelada
e pedindo bis.

Que a manicure arranque picanhas do seu dedo.
Que sua caipirinha venha com sal.
Que na fila para assistir o filme de suspense
alguém conte o final.

Que sua galinha pare de botar ovos.
Que alguém pise em sua joanete.
Que sua samambaia pegue sarampo
e tenha diabete.

Que ninguém note seu corte de cabelo.
Que ele não ligue sequer.
Que sua contagem regressiva
termine em mal me quer.

Que seu time desça para segunda divisão.
Que sua calça rasgue no cós.
Que um pombo cague no seu terno
hugo boss.

Que seus seios caiam feito as torres gêmeas.
Que seu marido mije no chão.
Que chova e vente
assim que sair do salão.

Que você perca o emprego fantasma.
Que ganhe um emprego de carne e osso.
Que seu filho arranje uma namorada
com aquilo roxo.

Que seu bilhete premiado da loteria
dissolva na máquina de lavar.
Que cresça bigode em sua noiva
assim que você se casar.

Que a vida jogue merda no seu ventilador.
E que apesar do peso
continue cagando e andando
com pés ilesos.

© 2023 • 1FICINA • Marcelo Ferrari