Parábola do cu

30/06/2022 by in category Textos tagged as , , with 0 and 0

Os órgãos começaram uma discussão sobre qual deles era o mais importante no corpo humano. Cada órgão dava suas razões para ser o mais importante.

— Eu sou o mais importante! — determinou o cérebro. — Eu sou aquele que pensa em tudo e comanda todos os outros!

O coração tratou de reivindicar o primeiro lugar em importância.

— O mais importante sou eu! — disse o coração. — Eu que bombeio o sangue para todos.

— Cala a boca, coração! — Os rins se manifestaram e falaram em uníssono. — Você não sabe o que está falando! Somos nós que filtramos o sangue que você bombeia. Se não fosse por nós, você e o cérebro estavam lascados.

— Calma lá! — disse o intestino — Se não fosse por mim, quem iria eliminar aquilo que não serve para o corpo? O mais importante sou eu!

Então, o cu se manifestou:

— Eu sou o mais importante!

A gargalhada foi geral. O cérebro foi o primeiro a sacanear…

— Tá maluco? — disse o cérebro — Você só faz merda!

Todos riram. O cu ficou invocado com a humilhação e se fechou de um jeito que não passava nem agulha. Nada de dentro para fora e nada de fora para dentro. No primeiro dia, ninguém sentiu nada com a greve do cu. No segundo dia, o cérebro já não parava de pensar no que fazer. No terceiro dia, o intestino começou a entrar em colapso por causa da superlotação. No quarto dia, o coração começou a disparar. No quinto dia, o corpo foi ficando amarelo e os órgãos, um a um, foram entrando em pane. E o cu ali, fechadinho. No sexto dia, já estavam todos implorando para o cu abrir só um pouquinho. O intestino chorava compulsivamente, o coração começou a sentir os efeitos da pressão, o cérebro entrou em paranoia, as pernas já não obedeciam, até que alguém gritou:

— Ok, cu, você também é importante! Agora alivia!

O cu se abriu. E todos entenderam a interdependência.

© 2023 • 1FICINA • Marcelo Ferrari