Após queimar o livro, Ramalho se dedicou inteiramente a encontrar Deus dentro de si. Passou cinco anos escrevendo em um caderno universitário que ganhou do bibliotecário. Enfileirou seus pensamentos e sentimentos e, através da escrita, questionou um por um, feito um investigador de polícia buscando descobrir a verdade.
Não foi um processo agradável, mas foi libertador. Ramalho teve que admitir ideias erradas que ele considerava certas. E pior! Teve que trazer à tona dores dilacerantes que havia enterrado no fundo da alma. Mas sobreviveu. Por fim, entendeu como essas ideias e dores influenciaram suas escolhas e como suas escolhas o levaram até a prisão.
Nas últimas páginas do caderno, Ramalho perdoou a si e a vida. Ele entendeu a alquimia da merda. Entendeu que o propósito da ignorância é induzir a fazer merda. Entendeu que o propósito da merda, é causar dor. E que a dor é o fogo que transforma a merda em sabedoria, que faz a merda servir de adubo para melhores escolhas.
Ramalho registrou essa descoberta escrevendo o seguinte poema:
Por mais que eu pense
Que é um estorvo
Sei que essa parede
Me ensina a esperar
Por mais que me sinta
Buscando pelo em ovo
Sei que essa sede
Me ensina a encontrar
Por mais que pareça
Soco em ponta de faca
Sei que essa ferida
Ensina a me curar
Por mais que enfie
O pé na mesma jaca
Sei que tudo na vida
Vem pra me ensinar
A vida é uma escola
A felicidade é dez no boletim
De quem aprendeu a ver o lado bom
Da coisa ruim