Quando cheguei para o almoço de domingo, minha irmã me disse:
— Fiz um curso de autoconhecimento que você deveria fazer também. Chama-se Leader Training. É legal e pode te ajudar no seu curso de PNL.
— Quanto custou? — perguntei.
— Fica tranquilo, — ela disse — se você quiser fazer, eu pago para você.
Aceitei a oferta.
O curso aconteceu em um hotel fazenda durante um final de semana. A cada etapa tinha um exercício diferente, todos visando o autoconhecimento. No final teve um exercício de regressão.
Deitados em colchonetes, respiramos bem rapidamente até entrarmos em uma espécie de transe. Depois, o coordenador foi nos conduzindo na regressão da memória através de comandos: “Volte na sua juventude. Olhe o que está acontecendo. Volte na infância”. Etc.
Estava seguindo os comandos e visitando minhas memórias, quando me dei conta que podia ter acesso a qualquer informação sobre minha vida. Era como se eu fosse o Google de mim mesmo. Bastava eu querer saber algo e a informação vinha à consciência.
Embora ainda estivesse ouvindo o instrutor e soubesse que meu corpo estava deitado no colchonete, o exercício de regressão perdeu a importância, ficou em segundo plano. Eu era o Google de mim mesmo e podia saber o que quisesse. Não podia desperdiçar a oportunidade.
“O que mais quero saber?”, me perguntei. Pensei em uma questão da juventude e a resposta começou a chegar à consciência, como se fosse um download. Só que antes de chegar completamente, me dei conta que aquilo não era o que mais queria saber. Então, parei de pensar naquela questão e pensei em outra. A mesma coisa aconteceu, mas também parei antes de concluir, pois senti que aquilo também não era o que mais queria saber.
Fiquei pensando e parando algumas vezes, até que lembrei de uma experiência que costumava ter quando era criança. Uma experiência muito desagradável, mas fascinante.
Com 5 anos de idade, eu acordava na cama e sabia que existia. Uma vez consciente da minha existência, com curiosidade infantil, me perguntava: “O que será o oposto disso?”. Eu não conhecia a palavra “existência” ainda, mas já sabia que tudo tinha oposto. Então, mesmo sem conhecer a palavra e o conceito de existência, queria saber o que era não-existir.
Eis o início do meu filme de terror. Eu me perguntava: “O que será o oposto disso?” e meu corpo começava a se desintegrar. Era como se eu fosse sugado por um aspirador existencial. Meus ossos gemiam de medo. Então, para desligar o aspirador, eu descia da cama, saía do quarto e procurava alguém para conversar, me distrair e me fazer esquecer da pergunta.
Isso aconteceu muitas vezes, até que de tanto sair do quarto e buscar distração, acabei me distraindo completamente e nunca mais lembrei dessa experiência. Mas naquele dia, deitado no colchonete, fazendo a busca no google de mim mesmo, essa cena voltou e senti que era isso que mais queria saber: “O que será o oposto de existir? O que será não-existir”.
Fiz a pergunta e imediatamente voltou o aspirador existencial. Só que dessa vez não tive medo. Não sei porque, mas o medo não aconteceu. Então, decidi que daquela vez eu iria até o fim, mesmo que fosse a morte. Deixei o aspirador me sugar completamente. E, de repente: puft! Deixei de existir.
Eu deixei de existir, mas tudo começou a existir dentro de mim, inclusive eu, ou seja, meu corpo. Isso que estou descrevendo, embora pareça impossível, é o que está acontecendo com você agora mesmo, só que você não está consciente disso. Eu também não estava, mas fiquei naquele instante. O oposto da existência era eu, não-existência, nada, vazio.
Pense no espaço como não-existência, nada, vazio. Sendo assim, me diga: tudo que existe contém o espaço ou está contido no espaço? Está contido no espaço, não é? O que eu sou, o que você é, o que todos os seres são, é como o espaço, não existe, é nada, vazio. Contudo, é óbvio que o espaço existe, caso contrário, onde estariam todas as coisas? Analogamente, embora eu, você e todos os seres não existam (formalmente falando), somos a base de tudo que existe.
Para ser mais prático no entendimento da metafísica do ser, vou te dar um exercício. Olhe para sua mão. Você sabe que o observador da sua mão é você e que você está observando sua mão através da visão. Agora considere que o observador não é você, é o espaço. Continue olhando para sua mão, mas considere que é o espaço que está vendo. Considere que o espaço é um olho capaz de enxergar. Sendo que o espaço não existe: quem está observando sua mão?
EUreka? Se ainda não, tudo bem, o que não existe não pode deixar de existir, pois não existe (kkkkkk) Então, em algum momento, você irá despertar da pegadinha materialista e ficar consciente de si. Vou prosseguir com o relato. Ah! Para mais explicações sobre a metafísica do ser, você pode ler os livros pedagógicos da 1ficina que estão disponíveis gratuitamente no site.
A primeira coisa que a EUreka existencial fez em mim, foi matar o equívoco da meditação. Eu havia aprendido na Gnose que meditar era não pensar. Eu havia passado anos frequentando a sala de meditação da escola e tentando não pensar. Só que eu estava em estado meditativo e continuava pensando. Tanto que o instrutor veio conversar comigo e conversei com ele.
— Onde você está? — o instrutor me perguntou.
— Estou em mim — respondi — E está ótimo aqui.
Ele riu e respondeu:
— Aproveita que daqui a pouco vai acabar.
Ou seja, durante todo o tempo do transe (vamos chamar assim) eu sabia que estava deitado no colchonete, fazendo um exercício, no curso de autoconhecimento, numa sala, num hotel, etc. Eu sabia porque pensava nisso e tinha consciência desses pensamentos.
Não posso falar pelos outros professores e escolas, mas suponho que o ensinamento “meditar é não pensar”, tem o objetivo de explicar que consciência não é pensamento. Se for isso, acho que é uma explicação infeliz, pois mais atrapalha do que ajuda.
A segunda coisa que a EUreka existencial fez em mim, foi me convocar para o trabalho de esclarecer esse equívoco da meditação. Muitas pessoas deviam estar presas nesse equívoco assim como eu estive e senti que tinha o dever moral de oferecer um esclarecimento sobre isso.
A terceira coisa que a EUreka existencial fez em mim, foi me encher de paz. Sendo não-existente, eu existia eternamente. Então, como diz no Bhagavad Gita, espadas não podem me cortar, o fogo não me queima, a água não me molha e o vento jamais me resseca.
A quarta coisa que a EUreka existencial fez em mim, foi me esclarecer que o caminho para verdade não é através da busca da verdade e sim através do encontro com a mentira. O que me atrapalhava entrar no estado meditativo não era verdade era mentira de que meditar é não pensar.
— Prepare-se! — o instrutor me disse — É hora de voltar.
Meu corpo era um fio de alta tensão, algo como eletricidade fluía por ele da cabeça aos pés.
— Voltando! Voltando! Voltando! — disse o instrutor.
Fazer um camelo passar pelo buraco de uma agulha explica bem o que significou voltar. Conforme fui voltando, minha consciência foi sendo espremida. Muita informação foi esquecida.
Por fim, voltei a existir.
A Base Do Supremo – Moreno Veloso