Nos primeiros meses de funcionamento da 1ficina, estava trabalhando como professor de inglês. Passava mais tempo dentro de ônibus, indo e voltando de escritórios de alunos, do que dando aula. Sobrava pouco tempo para produzir conteúdos para o blog da 1ficina (ainda não tinha site). Eu havia decidido que a 1ficina seria um trabalho gratuito, então, precisava encontrar um jeito de ser dono do meu tempo ao invés de ficar trocando ele por dinheiro.
Minha primeira ideia para mudar isso foi fazer encontros presenciais com doações voluntárias. Três pessoas foram ao primeiro encontro. Três irmãos que estavam em conflito. Expliquei sobre o outroísmo e consegui ajudá-los a entender a causa dos conflitos. No final, recebi uma generosa doação em dinheiro, mais do que esperava, mas como a divulgação foi grande e o público foi mínimo, concluí que arrecadar fundos com encontros presenciais não iria funcionar.
Minha segunda ideia foi colocar um anúncio para doações voluntárias em todas as páginas do blog. O título do anúncio era: “Me dê trabalho”. O texto dizia que eu precisava do apoio financeiro dos leitores para continuar trabalhando para eles. O link do anúncio levava para uma página com meus dados bancários. Nenhum centavo jamais foi depositado em minha conta em retorno a esse anúncio. Concluí que arrecadar fundos com anúncios no blog também não iria funcionar.
Foi então que tive uma conversa séria com a vida (digamos assim). Eu disse: “Olha, vida, já fazem anos que você está me empurrando para esse trabalho e finalmente cheguei. Só que é um trabalho gratuito e preciso me alimentar, pagar as contas, etc. Tenho uma proposta. Eu aceito fazer o trabalho gratuito se você pagar minhas contas. Enquanto você cumprir sua parte, eu cumpro a minha. Se parar, eu paro também, vou atrás de dinheiro e foda-se a coletividade humana e o despertar da consciência!”
Essa conversa realmente aconteceu dentro da minha cabeça. No dia seguinte, tive a ideia de alugar meu apartamento e sair de São Paulo. Desde esse dia, nunca a vida deixou de honrar nosso acordo, nem eu. Já fazem 11 anos que meu trabalho é apenas produzir e cuidar da 1ficina. Muitas pessoas, principalmente alunos, têm curiosidade sobre minha vida financeira. Tem uma resposta no site sobre isso. Transcrevo abaixo:
Pergunta: Como você consegue se manter financeiramente fazendo um trabalho gratuito?
Resposta: Sou uma pessoa sem ambições materiais. Minha ambição é por sabedoria. Dito isso, não tenho filhos. Não ter filhos é uma circunstância que favorece muito trabalhar gratuitamente. Outro fator favorecedor é ser proprietário de um imóvel, um apartamento. Com a renda do aluguel, pago minhas contas, vivo bem, e principalmente, posso trabalhar com o que amo. Para terminar, faço uma observação. Trabalho gratuito em inglês se diz “free work”. O que dá um duplo sentido. Literalmente, a tradução é “trabalho livre”. É isso! Não trabalho gratuitamente, sou um free worker (trabalhador livre). Recomendo. Creio que esse é o futuro do trabalho.
Certa vez, me perguntaram: “E quando você ficar velho?”.