Escrever uma música que fala “foda-se” é muito diferente de escrever um livro que usa a pedagogia do foda-se para explicar o bem viver. Como foi que uma coisa deu em outra? Bem, levou um tempo e surgiu também de um buraco.
Por volta de 2008, comecei a participar de um grupo espiritualista coordenado por um preto velho da pá virada chamado Joaquim. Nessa época, eu já havia lido e gostava muito dos ensinamentos de Krishnamurthi. Quando ouvi os ensinamentos de Joaquim, achei muito semelhante. E isso me espantou, porque Joaquim era um preto velho de umbanda. Mas também me atraiu. O que a umbanda tinha a ver com Krishnamurthi?
Não tinha nada a ver. Joaquim não era um preto velho, era um buda, ou era o próprio Krishnamurthi falando com voz de cebolinha. Não sei porque — quem quer que estivesse falando alí — decidiu falar com personalidade de preto velho associado a umbanda. Mas também não vem ao caso.
O fato é que Joaquim explicava sobre o foda-se. Só que ele não falava “foda-se”. Por mais que fosse um preto velho de umbanda, pé descalço, bebendo café e pitando cigarro, ele ainda tinha compostura. Então, quando estava explicando sobre o foda-se, ao invés de falar “foda-se!” ele falava “dane-se!”.
Passado uns dois anos, eu havia me tornado uma espécie de estagiário de Joaquim. Para garantir minha aprendizagem, ele me levava para assistir todas suas palestras, que geralmente aconteciam em grupos espiritualistas e centros espíritas espalhados pelo Brasil.
Como nos tornamos amigos também, Joaquim sabia que não tinha problema em falar palavrão. Então, durante suas palestras, toda vez que chegava no momento dele falar “dane-se”, ele não falava mais. Ele fazia uma pausa e apontava para mim. Eu fazia o trabalho sujo para ele, dizendo: foda-se! O povo caía na gargalhada e ele seguia com a palestra.
Devo ter falado foda-se para Joaquim uma centena de vezes. Juntando com a música, aquela sabedoria malcriada foi entrando em mim por osmose. Quando decidi escrever meu primeiro livro de autoconhecimento, para ter um ponto de partida como escritor nessa área, não tinha como escolher outro tema senão o bom e velho foooooda-se.
Foi o que fiz. E depois desfiz. E agora estou fazendo novamente. Mas enfim, contei tudo isso como introdução. A partir de agora vou me debruçar sobre o foda-se. Explicar do que se trata e como sua prática produz bem viver.