A primeira vez que ouvi sobre as cinco fases do luto, tive uma EUreka semelhante a Eureka que tive com a semiótica. Com a semiótica, pensei: “Significante e significado não acontecem só na linguagem, acontecem com tudo. Com as cinco fases do luto, pensei: “As cinco fases do luto não acontecem só com o luto, acontece com tudo”. E o que são as cinco fazes do luto? Essa é a parte mais fácil, pois já foi explicada por Elisabeth Kübler-Ross em sua obra “On Death and Dying” (Sobre a Morte e o Morrer) e está amplamente comentada na internet. O que vou fazer nesse livro, é mostrar que as cinco fases do luto não acontecem apenas no extraordinário evento do luto, mas a cada ordinário instante vivido, pois cada instante vivido é um instante já vivido, logo, perdido, morto. Espero com isso, ajudá-lo a lidar melhor com sua realidade. Boa leitura!
Não por acaso, Freud, ao estudar o desenvolvimento humano, também encontrou um processo com fases. Freud chamou essas fases de oral, anal e fálica. A fase anal é a fase da negação. Atenção! Freud não disse isso, sou eu que estou dizendo. E por que estou dizendo? Porque a fase anal é quando a criança não faz mais cocô involuntariamente, ela aprende a controlar o anus e dizer “não” para o instinto. Ou seja, aprende a negação do instinto.
Não existe aceitação sem a possibilidade de negação. Quando você aceita algo, voluntariamente, por escolha, você está abrindo mão da possibilidade de negar. Ou seja, é preciso existir a possibilidade de dizer não para você dizer sim. Imagine que você fosse incapaz de negar (dizer não). Alguém diria para você beber água da privada e você, incapaz de negar o pedido, beberia. É graças a possibilidade da negação (não) que existe a aceitação (sim), caso contrário, você não estaria aceitando de fato, pois não haveria outra opção.
A possibilidade de negação é fundamental para existência da sua autonomia também. Mais uma vez, imagine que você fosse incapaz de negar (dizer não). Alguém diria para você miar e você miaria. Alguém diria para você latir e você latiria. Alguém diria para você fazer fotossíntese e você faria. Percebe a escravidão? A possibilidade de negação é o fundamento da liberdade individual. É graças a possibilidade da negação que você tem autonomia para viver, caso contrário, você seria escravo dos outros e dos seus próprios instintos.
Nesse livro estamos investigando as cinco fases da negação da realidade, então, preciso começar definindo realidade. Vou usar uma definição empírica e autocientífica. Realidade é tudo que você experimenta. Tudo do verbo tudo. Tudo do verbo tudo mesmo. Tudo do verbo sem exceção. Observe tudo que você está experimentando agora e sempre, tanto externo como interno, tanto físico como psicológico. Eis sua realidade.
Não é possível experimentar uma realidade incriada. Primeiro a realidade precisa ser criada para depois ser experimentada. Igual um filme na televisão. Você não consegue assistir à cena de um filme sem que antes a televisão crie a cena na tela. Primeiro a televisão precisa criar a cena na tela para depois você poder assistir. O mesmo está acontecendo agora e sempre. Toda realidade que você experimenta é uma realidade criada por você e em você.
A parte difícil de entender nessa afirmação é que você acredita que a realidade que você experimenta é física e externa (transcendente). Não é! Essa realidade que você está experimentando é virtual e imanente como a realidade na tela de uma televisão. Parece física e externa, mas só parece. Uma boa forma inicial de você pensar na relação entre você e sua realidade é fazendo uma analogia entre uma televisão e o filme. Você não está dentro da realidade, é a realidade que está dentro de você, assim como o filme está dentro da televisão.
Sendo assim, note que a televisão existe sem o filme, mas o filme não existe sem a televisão. O que isso significa? Significa que a televisão é causa e o filme é efeito. Significa que a televisão é o criador e o filme é a criatura. Sendo que o filme é análogo à realidade, como fica isso? Você existe sem a realidade que está experimentando, mas a realidade não existe sem você. O que isso significa? Significa que você é causa e sua realidade é efeito. Significa que você é o criador da sua realidade e sua realidade é sua criatura.
A metáfora da televisão serve para esclarecer a relação entre criador e criatura, mas não serve para esclarecer como você cria sua realidade. Ao invés de pensar em si como uma televisão criando e assistindo um filme em si, pense em si como um videogame jogando um jogo em si. O que é preciso para jogar um jogo de videogame? Como você cria cada cena do jogo? É preciso fazer escolhas. Cada cena é criada através da sua escolha.
Eis como você cria sua realidade, através do arbítrio, igual em um jogo de videogame. Nesse momento, por exemplo, a realidade que você está experimentando é ler esse livro. Como foi que essa realidade se tornou objeto da sua experiência? Através do arbítrio. Você optou por pegar o celular. Optou por clicar no link do livro e está optando por ler. Se você optar por parar de ler agora, é isso que irá experimentar agora.
Se você entendeu o que foi explicado até aqui, qual é a grande conclusão? Se você é o criador da sua realidade e sua realidade é sua criatura, então, o culpado pela realidade que está experimentando é sempre você. A culpa é sempre sua. Mas se você é sempre o culpado, por que você nega sua realidade? Ora, porque você acredita que o culpado é outro. Esse outro pode receber vários nomes, deus, universo, chuva, sol, lei da gravidade, capitalismo, governo, fulano, ciclano, beltrano, etc. Seja que nome esse outro tiver, você atribuindo ao outro a culpa por sua realidade, não é você negando sua realidade (criação), é você negando o criador (autonegação). E se o criador da sua realidade é outro, então, não é você. Se não é você, então, você é vítima.
As cinco fases da negação da realidade é o processo consciencial que você atravessa para se conscientizar que você não é vítima, que é culpado. Você começa como vítima, negando que você é o criador da sua realidade, colocando a culpa no outro. Após atravessar as cinco fases, você chega na aceitação do óbvio: a culpa é minha. Claro que você não é o único criador do universo. Cada um é um criador. E durante uma co-criação, cada um é culpado apenas pelas suas escolhas. As cinco fases é você se conscientizando inclusive disso.
A primeira fase da negação da realidade é a negação da culpa. “Não é minha culpa! Não é minha culpa! Não é minha culpa!” você pensa e diz. Você acredita que o responsável por sua realidade não é você, o criador da sua realidade não é você. Se não é você, é o outro. Como disse acima, esse outro pode receber vários nomes, deus, universo, capitalismo, governo, fulano, ciclano, beltrano, etc. Seja qual nome esse outro tiver, você atribuindo ao outro a culpa por sua realidade, não é você negando sua realidade (criação), é você em autonegação (negando que você é o criador).
A segunda fase da negação da realidade é a vingança. Uma vez que você acredita que o outro é o responsável absoluto pelo seu infortúnio, que você não tem nada a ver com a realidade que está experimentando, que você é vítima absoluta do outro, você se enche de raiva e parte para a vingança contra o outro. Olho por olho, dente por dente. E se a vingança não puder ser executada diretamente, será executada indiretamente. Se o outro for uma pessoa púbica, por exemplo, você irá difamá-lo como forma de vingança.
A terceira fase da negação da realidade é suborno. Uma vez que você acredita que o outro é o responsável absoluto pelo seu infortúnio, que você não tem nada a ver com a realidade que está experimentando, que você é vítima absoluta do outro, você tenta subornar o outro para que ele crie uma realidade melhor para você. Um exemplo clássico da fase da submissão são as promessas que as pessoas fazem a Deus e aos santos.
A quarta fase da negação da realidade é a autopiedade. Uma vez que você acredita que o outro é o responsável absoluto pelo seu infortúnio, que você não tem nada a ver com a realidade que está experimentando, que você é vítima absoluta do outro, você entra em depressão. “Oh, coitado de mim! Sou um impotente! Sou uma vítima! Nem adianta fazer nada!”, você pensa e diz. A fase da autopiedade é o fundo do poço. Embora seja ruim estar no fundo do poço, é quando você está mais próximo de sair da negação.
A quinta fase da negação da realidade é a aceitação da culpa. É quando você entende que seu carro foi roubado porque você optou por comprá-lo. É quando você entende que sua esposa ou marido te traiu porque você optou pelo casamento. É quando você entende que seu filho é um fardo que você optou por ter. É quando você entende que você caiu em um golpe porque optou por acreditar na história do enganador. E se você for bem a fundo na investigação da culpa, é quando você entende que toda realidade que você experimenta é fruto da sua constante decisão em continuar vivendo.
Como disse no início desse livro, não existe aceitação sem a possibilidade de negação. O processo de negação é saudável e necessário para que a aceitação seja consciente e voluntária. Então, não adianta você ler esse livro e tentar pular para a aceitação. Isso é impossível. A aceitação é resultado da conscientização da culpa. E não tem como você se conscientizar pulando o processo de conscientização. O que você pode fazer é encarar o processo de conscientização lembrando do que está explicado nesse livro e praticando auto-observação. Quanto mais você fizer isso, mais fácil e rápido será da próxima vez.
Boa prática!