“No pain, no gain” é uma frase muito popular entre os marombeiros. Significa, “sem dor, sem ganho”. Só que os marombeiros não foram os primeiros a formular essa sabedoria. Fernando Pessoa, por exemplo, já havia observado essa sabedoria com as seguintes palavras: “Quem quer passar além do Bojador, tem que passar além da dor”.
Os portugueses não conheciam o Mapa Mundi. Ninguém conhecia. Não existia Mapa Mundi naquela época, mas ainda assim, os portugueses rasgaram os mares em precários navios de trinta metros e empurraram os limites do mundo e do homem até o Cabo do Não, nas costas do Senegal, que depois recebeu o nome de Cabo do Bojador. Muito longo e cercado por recifes, ali a neblina tampava a visão dos navegadores. Aqueles que passavam pelo Cabo do Não jamais voltavam. Muitos acreditavam que o mundo acabava depois do Cabo do Não e a neblina era o resultado da evaporação das águas que ferviam ao cair no inferno lá embaixo. Até que, em 1434, o navegador Gil Eanes disse sim para o Cabo do Não. Avançou e pronto! A terra e o homem não acabavam mais no Cabo do Não.
Fernando Pessoa fez uma analogia da autorrealização com a saga da navegação portuguesa. Bojador é uma metáfora para mediocridade. Para passar além da mediocridade, tem que passar além da dor. Óbvio! Suportar a dor é o alicerce da realização de qualquer tarefa e também da autorrealização. Você vive uma mentira porque não suporta a dor de ser rejeitado, a dor de ser criticado, a dor de ser maltratado, a dor de ser difamado, a dor de ser pressionado, etc. Você finge para fugir da dor. Seu lema é: fingir para fugir. Só que além de não conseguir fugir, sofre tentando e ainda vira escravo dos outros.
Certa vez, perguntaram ao filósofo Arthur Schopenhauer, qual é a opção mais sábia que um homem pode fazer na vida. Ele respondeu: “A opção mais sábia que um homem pode fazer na vida ele já não fez”. Schopenhauer se referia à opção de não nascer, uma vez que viver é se condenar a sofrer. Dizem que Schopenhauer foi pessimista, mas apenas disse o óbvio. Viver dói. Dói muito. Dói pra caralho. Dói para seres humanos, dói para bichos, dói para insetos, dói para frutas e legumes. A dor é inerente à experiência de viver. Nada escapa. Tentar fugir da dor só resulta em ampliação da mesma.
Realizadores não são seres humanos especiais nem imunes à dor, são seres humanos que não desistem de realizar o que querem apesar da dor. Realizadores preferem sentir a dor do fracasso à dor de sequer tentar. Preferem a dor do arrependimento à dor de não ter do que se arrepender. Realizadores se bancam e pagam o preço. O mesmo fazem os seres humanos que persistem na autorrealização. Claro que é mais fácil seguir a uniformidade do que seguir a própria consciência. Claro que é mais fácil copiar e colar do que escrever a própria história. O fingimento evita a dor do desprezo, da crítica, da rejeição, da censura e faz você ganhar joinha, beijo, palminha e coração. Só que não tem dor maior do que viver em autonegação.