A noite já está bem escura. Fábio e eu estamos caminhando para perto de uma árvore enorme que tem no meio da chácara. Não sei porque estamos caminhando naquela direção e nem qual é o assunto que disse que gostaria de conversar com ele, mas sei que é isto que devemos fazer agora. Fico calmo e sigo caminhando. De repente, entendo o motivo da caminhada e pergunto:
— Como fizemos para chegar aqui?
— Caminhamos — responde Fábio.
— Caminhamos como?
— Com nossas pernas.
— Quantas pernas você tem? — pergunto.
— Tenho duas.
— Assim também é a caminhada do ser humano pela experiência humana, temos duas pernas, sentimento e razão. E andar com uma perna só não funciona, pois uma perna precisa da outra.
— Porque está me falando isto? — Fábio pergunta.
— Você tem a perna racional bem forte, mas você vive entre seres bastante sentimentais. Para muitas pessoas não faz sentido o que você pensa, pois o viver delas não é pensar, é sentir.
— Entendi. Como fica então?
— Basta respeitar o jeito delas. Assim você não força ninguém a usar demais uma perna fraca. Além do que, você também não poder andar só com a perna da razão, então, estas pessoas estão sempre lhe ensinando a usar a perna do sentimento.
— Meus amigos me acham frio por não sofrer com o sofrimento deles. — diz Fábio.
— Pessoas com muito sentimento e pouca razão tendem a igualar amor com dó, pena, piedade. Então, se você não tem dó, significa que você não ama, que é frio. Por isto que só sentimento, sem razão, não resulta em bem viver.
— Sempre penso nisto.
— Conhece a história do cara que ganhou um cavalo?
— Acho que não.
— Um fazendeiro ganhou um cavalo no bingo. Seu vizinho lhe disse: “Que sorte!”. O fazendeiro respondeu: “Sorte ou azar, o tempo é que dirá!”. Algum tempo depois o cavalo fugiu e o filho do fazendeiro ficou muito triste. Seu vizinho lhe disse: “Que pena!”. O homem respondeu: “Sorte ou azar, o tempo é que dirá!”. Meses depois, o cavalo reapareceu trazendo consigo um bando de cavalos selvagens. Seu vizinho lhe disse: “Que sorte!”. O homem respondeu: “Sorte ou azar, o tempo é que dirá!”. Um dia, o filho do fazendeiro estava andando em um dos cavalos, caiu, quebrou a perna e ficou aleijado. O vizinho disse: “Que pena!”. O homem respondeu: “Sorte ou azar, o tempo é que dirá!”. Algum tempo depois, houve uma guerra naquele pais, todos os jovens foram convocados para lutar, exceto o rapaz que, por ser aleijado, foi poupado.
— Já conhecia esta história— diz Fabio.
— Que pena! — exclamo.